Esta semana numa reunião fiquei desarmado quando me disseram, por piada, que eu há uns bons 20 anos tinha perseguido de carro por cima do passeio uma namorada, enquanto ela fugia com um poeta (um aderente ao islamismo com camisas sem colarinho e barba de 3 dias). Estão a ver o estilo!
Na altura andava fixado nos filmes do André Téchiné e achei que uma forma piegas de mostrar a minha dor era atirar o MGB-GT contra os idiotas. A manobra controlada permitiu uma take perfeita, com efeitos de chuva e a participação de um polícia como actor secundário que apitou e me imobiliz ou em pleno Cais Sodré , mandando-me embora solidário com a causa masculina.
Toda a gente na reunião ficou curiosa para saber mais. Logo: o tema era aliciante já que jornalistas se interessavam pela história.
Revelo o desfecho: passadas horas estava a cear com a «vítima» enquanto o poeta recolhia para fazer mais um poema indecifrável. Vista à distância é uma história divertida e que gosto de recordar com essa velha amiga entre gargalhadas.
Vem isto a despropósito do seguinte ensaio: que foto poderia resumir toda esta cena, caso a quisesse contar por imagem? Difícil: .. deveria ser uma fotografia que mostrasse ao mesmo tempo o local, a expressão assustada dos perseguidos, a minha expressão incontrolada , o carro e as gotas de água da chuva, o polícia a intervir, enfim: uma fotografia que contasse por si a história. Com técnica, enquadramento justo, e luz de cinema para impressionar. Uma fotografia praticamente impossível de fazer em reportagem.
Cada um de nós tem uma imagem feita de um acontecimento, e muitas vezes é difícil para o fotógrafo sintetizar toda a história num só momento.
As fotografias para serem partilhadas necessitam de um emissor e de um receptor. Se o receptor faz ruído, a comunicação vai-se. Já acontecia no Pátio das Cantigas!
Daí a choramingueira habitual dos fotógrafos de que são uns incompreendidos, e as críticas de quem olha e não consegue ver.
A angústia do fotógrafo perante o instante é que as imagens da nossa vida ficam quase sempre, e só, na nossa cabeça: nunca as vimos, raramente as tirámos, mas estão dentro de nós. E são sempre as eleitas.
Daí a choramingueira habitual dos fotógrafos de que são uns incompreendidos, e as críticas de quem olha e não consegue ver.
A angústia do fotógrafo perante o instante é que as imagens da nossa vida ficam quase sempre, e só, na nossa cabeça: nunca as vimos, raramente as tirámos, mas estão dentro de nós. E são sempre as eleitas.
(também em: www.expresso.pt)
Muito bom post. Devia escrever mais aqui sobre fotografia. Eu ia gostar.
ResponderEliminarUma "crónica"... inteligente!
ResponderEliminarEste "fotojornalista" não consegue resistir a usar no seu blogue a máquina fotográfica como caneta... Penso que me faço entender.
E o quadro faz a metáfora perfeita do texto.
Já agora o "actor secundário" só apitou ou passou-lhe uma multa. Se não passou devia ter passado, porque levar uma tampa à conta de um "islamita" merece castigo.