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quinta-feira, abril 07, 2011

O FMI EM PORTUGAL EM 1983. Fotos de Luiz Carvalho.








quarta-feira, abril 06, 2011

Gostar ou não gostar de Sócrates

Fico admirado como muita gente com cultura política, e responsabilidades sociais, continua a ver no desempenho da política uma forma de fulanização. Olham para a política como olham para um clube de futebol, sem racionalidade, sem entenderem as circunstâncias. A célebre frase de que o homem é ele e as suas circunstâncias não pode ser mais útil quando abordamos a política.

Portanto: neste momento não me parece nada que o que está em causa é o facto de Sócrates ser um convencido, arrogante, habilidoso e teimoso. Nem me parece que o que está em causa para Portugal neste momento seja o facto de ter um primeiro-ministro que desliga o telefone a directores de jornais, que acha os jornalistas uns selvagens, que usa um fotógrafo oficial que é um misto de bodyguard e modelo do Continente, ou que tenha um tio que tem imensa graça e gosta de Aston Martin. E podíamos continuar com faits-divers divertidos sobre o engenheiro que tirou o diploma a pulso de um tabelião num domingo à matinée.

O que está em causa em Portugal é só isto: os últimos 20 anos foram vividos no paradigma do crescimento sem desenvolvimento estruturado, no ardil do crédito fácil, barato, e não controlado, de uma banca especuladora e parasita, que nem apoiou sequer a indústria produtiva. Todos vivemos à custa de um facilitismo dado pelo sistema capitalista: os mercados é que mandam, e mandam que cada cidadão seja um consumidor activo. A política passou a ser feita também nesse modelo: crédito para os autarcas-caciques, para as empresas públicas e para um Estado pesado, caro e muito pouco eficiente. Um Estado de burocratas, incompetentes, de chefinhos a serem conduzidos em carros cinzentos metalizados pagos por nós.

Este modelo até funcionava, até que um dia a banca globalizada perdeu triliões com a bronca da Lemon Brothers e agora tem que ir buscar o capital perdido ao elo mais fraco: os países mais fragilizados, mais devedores e mais reféns do seu desenvolvimento anémico, também fruto dos outros países com mais capacidade de produção. E também apostam no enfraquecimento do Euro a favor do dólar, claro.

A Europa perdeu o espírito inicial de Delors outros europeístas. A solidariedade política da Alemanha virou desprezo e arrogância através de Merkl ( da família do PSD) que vê nos países limítrofes um empecilho para o seu crescimento.

Portanto: com TGV ou sem, com mais auto-estradas ou menos, com menos serviço nacional de saúde, ou com menos educação, Portugal estaria hoje numa situação muito semelhante à que está. A Irlanda era o paradigma que sabemos, a Grécia era bestial pois até nos tinha ultrapassado, a Espanha até tinha superavit, A Itália continuava na maior e a vender Ferraris, a Bélgica um oásis, a Inglaterra notável depois da ensaboadela de Tatcher e dos anos Blair... Estamos a ver que hoje estão como nós, ou piores.

E os que aceitaram o FMI não ganharam estabilidade financeira nem económica, nem estão a crescer, e não vêm luz ao fundo do túnel.

Quem agora acha que a crise política que o Cavaco, o PSD e o CDS criaram, com o conluío do PCP e do BE ( é bom não esquecer), vai acabar numas eleições clarificadoras, com os rapazes de Passos Coelho aliados aos queques do CDS, abençoados por Cavaco, ou são ingénuos ou andam a ver muitos filmes de gangsters.

O chumbo das medidas que tinham sido aceites pelos parceiros europeus, o tal PEC 4 que era 3, foi a maior golpaça que alguma vez se fez políticamente em Portugal. Foi um crime contra os portugueses e um atentado bombista aos bolsos dos contribuintes e daqueles que vivem no limiar da sobrevivência.

Em nome da ganância, do ressabiamento, da jogada política. Um golpe de Estado sem mostrar alternativas, porque as alternativas que eles vão trazer serão muito mais dolorosas e desgraçadas para o país. Medidas para que os pobres fiquem desamparados, a classe média falida e os ricos cada vez mais ricos. Fim do Serviço Nacional de Saúde para todos, fim do ensino público para todos, fim de regalias sociais como o 13º mês, mudanças ainda mais radicais nas reformas, fim do despedimento sem justa causa, fim das indemnizações por desemprego, fim do actual sistema de subsidio de desemprego, aumento do IVA e tudo o que a imaginação sanguinolenta da direita tiver.

Chamar mentiroso ao Sócrates como quem chama mentiroso ao árbitro é mesmo de quem tem da política uma visão futeboleira. Mas não é esta gentinha que anda a levar Cavaco no andor há quase 30 anos? Queriam o quê? Assobiem o Sócrates e sigam o Cavaco. O abismo está a seguir.