domingo, junho 21, 2009
O meu MGB e o TGV
Há 25 anos em plena crise económica em Portugal, desemprego, fome em Setúbal, Bloco-central no poder, gasolina a preços proibitivos, eu era um arquitecto sem grande futuro e um fotojornalista promissor. Tinha amealhado uns dinheiros e trocado o meu Dyane com 110 mil quilómetros (que tinha comprado novo) por um Citroen Visa, na altura um carrito com algum vistaço. Passados 6 meses de ter o pequeno-aburguesado utilitário, um amigo meu arquitecto demonstrou-me que era uma patetice gastar 330 contos num carreco novo quando por menos podia andar montado num MGB usado e que a diferença de preço ainda dava para sustentar o guloso MGB por uns dois ou três anos.
Fiz contas, entreguei o Visa num stand e trouxe um MGB-GT lindo, de jantes raiadas, volante de madeira, roncar de bólide e um charme eterno. Eu, um teso, andava com um carro esplêndido que me tinha custado menos do que um utilitário. Claro que a primeira revisão custou-me logo 40 contos, mesmo assim ainda não estava a perder dinheiro. Na oficina insistiam em me tratar por doutor e o sr.Alexandre, o chefe, aconselhava-me a pôr liquido refrigerante no radiador, em vez de água, por causa das viagens no inverno à Serra Nevada (ele estava sempre convencido que eu ia e até citava o Dr. Balsemão que ia, e que estava longe de vir a ser o meu patrão).
Para os meus amigos ter comprado um MGB era uma loucura. Ficaria comprometido o meu futuro financeiro, perderia poder de compra, gastaria um exagero em gasolina, pagaria contas caladas de oficina, o meu filho só poderia andar no banco de trás até aos 10 anos ( e já tinha 7), não dormiria descansado com aquele carro na rua, não dava para trabalhar como repórter, enfim: eu estava doido e acabaria por vender o carro passado pouco tempo, agoiravam entre moralismos e uma evidente inveja. Tive o MGB 14 anos, vendi-o por 1850 contos, mais 1500 contos do que na compra. E só o vendi porque já tinha um Porsche e eram dois carros rivais entre si. Optei pela mudança e por outra cultura automóvel. Mas ainda tenho todos os dias umas saudades incríveis do carro. Namorei, viajei, roubaram-mo, reavi-o, tive um acidente enorme com ele em Espanha e foi estúpido vendê-lo.
Esta minha aventura faz-me lembrar a discussão sobre termos ou não TGV. À partida tudo parece uma questão de simples bom senso não termos TGV. Há óptimos e baratos voos low-coast e o comboio tradicional serve para fazer 200 quilómetros até Elvas e 300 até ao Porto. Portugal pode investir em coisas com retorno mais imediato. Mas esta é a questão que se põe quando na nossa vida temos de fazer opções de fundo. Comprar casa ou alugar ? Comprar o Rolex com que sempre sonhámos ou um Swatch? Ir fazer aquela longa viagem ou ir para a INATEL? Casar ou viver eternamente num t0 com vista para Alfama? Ter filhos ou uma discoteca invejável? Tudo são opções. E aquela frase: se casa não pensa, se pensa não casa, aplica-se bem ao TGV.
Agora podemos achar que o investimento vai ser brutal, no futuro vamos olhar para trás e vermos que foi a oportunidade perdida.
Começo a pensar que não basta uma análise economicista para recuarmos no TGV. Estamos fartos de economistas e das suas opiniões burocráticas e pessimistas. Porventura temos mesmo de avançar, não a todo o vapor, mas a todo o power.
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todas as opinioes podem chegar mas absurdo é colocar pequenos "luxos pessoais" no patamar de questoes de impacto nacional
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