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sábado, fevereiro 23, 2008

Rendez-vous com Charles Aznavour

Luiz Carvalho com Aznavour o mês passado em Paris

Há um dia em que acabamos por tocar nos nossos mitos.
Cresci a ouvir o Charles Aznavour no meu transístor AIWA nas manhãs de domingo antes da missa ou depois do jantar na rádio no "Quando o telefone toca" do " senhor Matos Maia". Era tudo um bocado deprimente: a luz fraca da casa, a televisão a preto e branco, o som fanhoso do rádio de bolso. Então as luzes embutidas eram lâmpadas de 15 velas, o plasma um caixote medonho, o Ipod o rádio de bolso. O Aznavour enchia a casa, dava ânimo, punha um romantismo afrancesado que ligava bem com as aulas de francês do Liceu Padre António Vieira. Não era só o Aznavour que impressionava. O Bécaud, mais tarde, bastante mais tarde o Ferré, o Gaisnsbourg, a Francoise Hardy... todos os franceses nos batiam no coração.

O Aznavour era o meu preferido. Um mito. No início dos anos setenta o Aznavour era já um "facho" danado, depois dos meus amigos maoístas me porem no gira-discos o LuÍs Cília a cantar " era uma vez um soldadinho" ou o José Mário Branco a gritar " Ei companheiro aqui estou!". Sempre achei a canção de intervenção pavorosa, embora mais tarde tenha ficado amigo do Cília e do José Mário.

Este enquadramento histórico (!) vem para dizer que no final de anos e anos a ouvir Aznavour acabei por o encontrar num terceiro andar de um apartamento de Paris. Ali estava à minha frente um dos artistas da minha vida. Afinal, não envelheceu assim tanto, embora vá nos 83, é mais baixo que eu (difícil!) e é de um charme que o torna numa pessoa encantadora.

No escritório onde funciona também uma produtora sua, Aznavour exibe uma genica física notável. Tem vários encontros naquela manhã, aceita falar enquanto insiste ao telemóvel com a irmã para ir a Paris almoçar com ele.

Fala pausadamente e encara a sua história de vida com uma imensa tranquilidade.

Fico surpreendido com a sua memória. Lembra-se de nomes de ruas de Lisboa, da Amália, do restaurante onde foi num ano distante num país longínquo.

Teve uma vida cheia e resume a felicidade a poder estar com a família (faz questão em almoçar sempre com os seus), com os três cães e de descansar na casa de campo.

Ainda tem o público a seus pés. É reconhecido, solicitado, respeitado.

Tem um espírito de solidariedade raro nos dias que correm, o que o faz ser " o maior pedinchão do Mundo". Pede a tudo e a todos para os deserdados da sorte, quer se tratem de irmãos arménios ou pobres referenciados.

O Aznavour é um fotógrafo amador em grande estilo. Apontou-me a minha máquina e deixou-me embatocado. Ele acabava de receber uma câmera topo de gama do último modelo enquanto a minha mais parecia um táxi de Lisboa!...

Falou com toda a disponibilidade para a minha colega Katia Delembeuf que o entrevistava para a Única. Ficou admirado com o seu francês.

Aturou-me o tempo todo a fotografá-lo. Aceitou sentar-se ao piano e tocar, posou junto a um poster de Charles Trenet, o seu cantor preferido, ainda o segui na saída. Um sorriso no elevador e uma corrida sobre uma chuva miudinha até ao Peugeot onde o motorista o esperava para o levar a mais um almoço em família.

Até sábado no palco de Lisboa, meu querido Aznavour.

Luiz Carvalho

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3 comentários:

  1. Inesquecível também para mim, o Charles Aznavour! Um dos últimos grandes de uma época de glamour e romance que as jovens gerações de bárbaros com agrafes nos lábios, nas sobrancelhas e noutros sítios , ruminantes de pipocas nos cinemas e "bué fixex táx a ver" nunca sentirão. E ainda bem, porque não merecem.

    Entre muitas outras, para mim sempre inesquecíveis as músicas "Qui c'est triste Venise" e claro, "La Bohème".

    Espero que seja um grande espectáculo e ainda bem Luís, que conseguiu privar com ele. Nem todos conseguem realizar esses sonhos.

    João V.

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  2. embora prefira os Led Zeppellin e os Sex Pistols tb tenho saudades do Aznvour que era uma espécie de saco de água quente em noites de invernia e a jeitosa da siemens tinha os pés gelados,,,,
    Olha e já agora que venha o Grande Adamo

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  3. "O Aznavour é um fotógrafo amador em grande estilo."
    Pensava que os fotografos amadores eram, para si, todos mediocres...

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