segunda-feira, outubro 29, 2007
Reviver o passado numa gaveta de fotos
O meu sobrinho abriu uma gaveta e começou a tirar de lá fotografias antigas em catadupa, de que eu já não me lembrava ter feito e impresso. Boas tiragens em papel Ilford, glossy, tudo feito com Leica e 35 mm de focal.
Na verdade o grão, a textura e a desigualdade tonal de cada uma, imprimem a cada uma daquelas fotos uma personalidade própria.
Cada tiragem é única, original. Era um um dos encantos da fotografia analógica: pegamos nas fotos com cuidado pois sabemos que mesmo repetindo-as na câmara escura nunca ficarão iguais; podem ficar melhores mas nunca iguais.
Este lado artesanal da fotografia acabou. Fiquei a pensar como eu tinha tempo e paciência para me fechar no escuro e imprimir dezenas de fotos, lavando-as e secando-as de seguida.
Ganhámos tempo e afinal continuamos a não ter tempo. Temos ainda menos tempo.
Há minutos o meu filho de 6 anos quis pôr na parede do seu quarto uma fotografia minha em cima de um jeep durante uma reportagem em Moçambique, ainda havia guerra civil, e ficou admirado por me ver ao lado de um Hummer, em 1991 junto à frente com o Curdistão iraquiano. São fotografias banais mas que impressionam. A memória fascina.
Podemos discutir técnica, pixels e definição, mas é o conteúdo que prevalece no acto de ver fotografias. Daí a paixão que a fotografia motiva e daí a convicção que todos nós temos de sermos uns grandes fotógrafos. Começando por mim, claro...
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A memoria, quando canalizada para aquilo que gostamos é optimo , assim também ,quando ela é canalizada para aquilo que destestamos, a coisa azeda.
ResponderEliminareu também tenho umas gavetas cheias de fotos e até nem quero vê-las, pelos bons momentos que representam e sabendo eu que nunca mais voltam. é a vida!
As vantagens dos sistemas digitais foram muitas. A curva de aprendizagem, o acesso a técnicas que eram inacessíveis, etc.
ResponderEliminarOs equipamentos e o software, aproximaram as imagens dos entusiastas das obtidas pelos profissionais.
Este foi o maior dos contributos do digital. Mais que nunca o que faz a diferença é o CONTEÚDO. Para isso é preciso lá estar e saber olhar.
Este é um desafio que poucos parecem aceitar. Não se fará mais a diferença por imagens de técnica muito apurada e de cores saturadas. Tal já é banal.
Os postais estão em crise. Pedem-se imagens pensadas, com histórias para contar ou com um desafio para a imaginar.
Por outro lado, temo que daqui a uns anos não haja gavetas dessas para descobrir.
As imagens vão se perdendo por CDS e discos duros. Provavelmente daqui a 30 anos estão perdidos, danificados ou esquecidos.
Haverá software para revelar um raw actual daqui a 30 anos?
As imagens são para imprimir. É a forma correcta de as apreciar, de as valorizar e provavelmente de as guardar.
«GAIVOTA
ResponderEliminar[poema de Alexandre O’Neill]
Se uma gaivota viesse
Trazer-me o céu de Lisboa
No desenho que fizesse,
Nesse céu onde o olhar
É uma asa que não voa,
Esmorece e cai no mar.
Que perfeito coração
No meu peito bateria,
Meu amor na tua mão,
Nessa mão onde cabia
Perfeito o meu coração.
Se um português marinheiro,
Dos sete mares andarilho,
Fosse, quem sabe, o primeiro
A contar-me o que inventasse,
Se um olhar de novo brilho
No meu olhar se enlaçasse.
Que perfeito coração
No meu peito bateria,
Meu amor na tua mão,
Nessa mão onde cabia
Perfeito o meu coração.
Se ao dizer adeus à vida
As aves todas do céu
Me dessem na despedida
O teu olhar derradeiro,
Esse olhar que era só teu,
Amor que foste o primeiro.
Que perfeito coração
No meu peito morreria,
Meu amor na tua mão,
Nessa mão onde perfeito
Bateu o meu coração.»
... memórias em disco duro realmente não funcionam...
ResponderEliminarEsses prazeres da fotografia analógica estão agora mais perto de meia dúzia de tolos amadores que ainda vão batendo umas chapas e fazendo uns bonecos a preto e branco...
e a Rolli já reviveu os seus rolos... e agora até vende uns kits para revelação de filme bem porreiros...
O que falta mesmo é tempo e às vezes amor à arte...
É um dos meus poemas preferidos.
ResponderEliminarInterpretado pelo CC então, é uma coisa do outro mundo.
Digital não tem que ser monitor e nem só de analógico vive a alma.
Também se pode fazer poesia e boas impressões com sistemas digitais.
Os equipamentos e técnicas são simples meios, não são fins. Pelo menos para mim.
Afinal, o grande desafio da fotografia não foi, desde a sua nascença, a tentativa de fixar num papel um momento que pode ser único?
ResponderEliminar(ainda tenho o laboratório p/b a funcionar e de vez em quando ainda é utilizado. Há momentos em que o facto de termos uma pelicula na máquina fotográfica, parece influenciar a forma e a abordagem daquele momento).
a Rolli tem kits de quê? não percebi elucidem-me...
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