Com a devida vénia ao José Manuel Fernandes, caro amigo e director do jornal Público, não posso deixar de transcrever aqui a sua excelente peça, publicada no seu jornal de hoje, sobre a evolução dos jornais em papel e online.
Ele esteve agora num encontro mundial de jornalistas em Moscovo onde muita coisa a ferver se discutiu. Eu subscrevo totalmente o que foi dito. Mais: é minha profunda convicção de que o rumo vai ser este para a imprensa nos próximos anos.
Como me dizia hoje Paulo Querido, tudo evoluiu muito rápidamente nos últimos três meses.
A internet não traz leitores para o papel, ao contrário: pode criar um novo público consumidor dos títulos de referência e com essa audiência é uma nova forma de negócio, através da publicidade, que se abre.
Aí vai:
Os jornais têm de mudar depressa e vão passar por tempos turbulentos, pois se há um "admirável mundo novo" à vista, poucos ainda descobriram qual o modelo de negócio que entretanto lhes permitirá sobreviver
Nathan Stoll tem ainda um ar adolescente e farta-se de repetir que não é jornalista, antes um computer scientist. Com razão, sobretudo se nos lembrarmos do seu curriculum e soubermos que trabalha na Google. Contudo, foi um dos que desenvolveram o algoritmo que faz funcionar os computadores que seleccionam automaticamente as notícias mais importantes para as disponibilizar no Google News. Na sala cheia de directores e editores seguia-se com alguma desconfiança o fio do seu raciocínio e muitos percebiam que estava ali uma das ameaças ao jornalismo tal como hoje o conhecemos - uma ameaça bem real.
Na manhã seguinte um escocês com um ar particularmente excêntrico subiria ao mesmo palco, do 13.º Fórum Mundial de Directores, que ontem terminou em Moscovo, para confessar ser um leitor compulsivo desde muito novo e acreditar que só assim tinha chegado onde chegou, ao topo da Microsoft. Com o cabelo apanhado num rabo-de-cavalo e envergando o tradicional kilt, a sua mensagem era bem diferente: para ele os jornalistas serão sempre os autenticadores das notícias, mas terão de habituar-se a trabalhar de forma muito diferente. Para a sala trouxe um pequeno aparelho do tamanho de uma folha A4 e com a espessura de um dedo onde já é possível ler, com a mesma facilidade que no papel, o The New York Times.
O projecto não está ainda concluído (prometeram-no para daqui a seis, oito semanas), mas quando estiver, o leitor habitual do jornal nova-iorquino receberá de hora a hora no seu aparelho (ou no seu computador) a versão actualizada do seu jornal e tudo o que foi publicado nos sete dias anteriores. A paginação tem a mesma legibilidade da de um jornal impresso, agora mais fácil de ler no metro ou à mesa do café. E com a vantagem adicional de incluir os mesmos anúncios, ou semelhantes, da edição em papel.
Durante os três dias que estiveram reunidos em Moscovo, 1700 proprietários e directores de jornais escutaram visões muito distintas - mas quase sempre desafiantes - sobre o futuro da sua indústria. Confirmaram que tudo está a mudar, e muito mais depressa do que se julgava. Se a nível global a imprensa ainda cresce graças ao boom da Índia e da China, nos países desenvolvidos os números indicam uma tendência para o declínio e uma enorme dificuldade em atrair novos leitores.
Mais: se antes haviam sobrevivido bem à rádio e à televisão, se nos primeiros tempos da Internet até foram protagonistas na sua rápida expansão, hoje enfrentam o desafio dos chamados "cidadãos jornalistas" - de que os blogues são apenas uma manifestação - mas também da ideia de que o acesso à informação não necessita de ser pago "já que ela está por todo o lado".
Jornais procuram novas formas de captar público
Para enfrentar este novo tipo de desafios, jornais de todo o mundo estão a procurar novas soluções que implicam inovação, inovação e mais inovação. Tabus de há alguns anos começam a cair.
O Washington Post veio por exemplo dar conta de que, na sua redacção, já há 50 jornalistas que saem para a rua com uma câmara de vídeo, que já instalaram um estúdio de rádio e que a empresa assumiu de alto a baixo que a interactividade com os leitores é um mecanismo essencial para sobreviver.
Jornais sérios e circunspectos, como o El País, explicaram que para conseguirem aumentar as suas vendas ao fim-de-semana - e terem muito mais mulheres a lerem-no - alteraram o registo habitual e vão antes à procura do lado humano dos políticos e das figuras públicas.
Algumas soluções adoptadas pelo The Guardian aquando da sua remodelação gráfica foram destacadas por representarem uma viragem e não apenas uma nova roupagem: "Encontraram formas de dizer mais com menos palavras", sublinhou o representante da empresa de consultadoria Innovation enquanto mostrava como grandes fotografias obrigavam o texto quase a desaparecer, com vantagem para todos.
O principal jornal económico da Holanda, que também está a testar um suporte semelhante ao apresentado pela Microsoft, mas trabalhando com a Phillips e uma universidade, fez todos lerem algumas mensagens de jovens sublinhando a importância de nas redacções existirem mais pessoas que já cresceram "na era do digital".
Mesmo assim, num ponto quase todos convergiram: os jornais e os jornalistas podem e devem continuar a funcionar como referências, como "marcadores" no oceano de informações dispersas, no fundo, como "autenticadores de notícias", na expressão do escocês da Microsoft. Mas, para tal, o que contará mais será a fiabilidade, utilidade e proximidade das "marcas", isto é, dos títulos prestigiosos da imprensa clássica. Se não conseguirem manter esse lugar, os jornais podem atravessar um período ainda mais conturbado do que o actual, em que as receitas em queda começam a não suportar custos fixos muito altos.
um membro tão distinto da classe jornalística devia saber que o jornal não se chama O PÚBLICO mas tão simplesmente, PÚBLICO.
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