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sábado, abril 05, 2008

Como sobreviver às fotos da socialite


Jean Claude-Leroy chamou hoje de mentirosos aos magazines que dizem não ter dinheiro para pagarem longas estadias a fotojornalistas em cenários de guerra mas que pagam fortunas por imagens do social. É uma meia-verdade. É preciso acrescentar que sempre assim foi, tirando a LIFE, a TIME e a NEWSWEEK nos anos 80-90. O que acontece hoje é que agências como a Reuters e a AP ,que antes do digital só disponibilizavam fotos na hora de má qualidade, passaram agora, há 7-8 anos, a pôr em em linha fotografias com resolução para imprimir em qualquer revista exigente. Ao mesmo tempo a qualidade dos fotógrafos destas agências de news melhorou muito. Há excelentes fotojornalistas a trabalharem em news. Aquele nicho que a Gamma, Sygma e Sipa disputavam passou a estar preenchido com as grandes agências. A Reuters tem 400 escritórios em todo o Mundo !
Por outro lado a rapidez das televisões acaba por tirar frescura às fotos mostradas passados dias. mesmo que as fotografias sejam melhores, o efeito de surpresa desvanece-se com a televisão.

Portanto: perante a concorrência das agências de news, televisão e jornalismo do cidadão, o fotojornalismo de autor tem de encontrar uma nova linguagem, um enfoque diferente, tem de continuar a surpreender pela novidade e pela emoção.
Outra verdade: é muito caro manter um fotógrafo por exemplo em Bagdad. Se for um correspondente que viva lá torna-se mais barato. Para circular em zonas de guerra são necessários apoios logísticos grandes e meios caros. A diária de um hotel nessas zonas é mais caro que em Nova York, os carros de aluguer têm um preço proibitivo e as comunicações muito caras, quando as há. Os free-lancers arranjam borlas para dormirem, vão com um dos lados beligerantes, aceitam condições de trabalho desgraçadas para poderem trazer imagens diferentes. Aqui encontramos o tal jornalismo militante que acaba por dar trabalhos extraordinários. É neste romantismo que encontramos o melhor que há e que encontramos em Perpignan. Mas temos de reconhecer que para o comum dos leitores este tipo de relatos tem de ser bem temperado com faits-divers para amaciar a dose. O Paris-Match, o VSD ou a Stern ainda têm espaço para estas reportagens mas a internet é agora o meio ideal para circular este género de reportagens. Só que a internet não paga, ou paga a um décimo do preço.

Quando fui responsável pela fotografia do Expresso chegavam-me portfolios fantásticos mas que se tornavam difíceis de publicar: eram caros, a pb, com nenhum pretexto de actualidade para serem publicados. Depois a crueldade e a dureza de alguns temas acabam por marcar demasiado uma edição que não pode ser " carregada" nos tempos que correm.

Os leitores aceitam ver imagens dolorosas numa exposição mas não lhes agrada muito vê-las ao sábado ao pequeno-almoço depois de terem pago 3 euros ou 4 por um jornal. Esta é a verdade. É como passar documentários sociais no prime-time. Foge tudo para a novela. E podemos não estar de acordo mas é esta a realidade cultural, onde há uma classe média, e é ela que compra os jornais.

A situação não é nova. Capa fez moda para sobreviver, Erwitt fotografou frigorificos para a Westhingous, Burt Glin trabalhou 20 anos para um laboratório farmacêutico, Salgado fotografava conselhos de ministros à quinta para pagar os pb de África.

A ideia de que se vive do fotojornalismo puro e duro é um mito. Talvez o Nachtwey e mais meia dúzia. E quem vive em Portugal aparentemente de free-lancer ou tem pais ricos ou anda a trabalhar no duro nos intervalos das reportagens.
Acho que não há receitas mas a sobrevivência do fotojornalismo de autor está a passar pelo apoio de instituições. O que é bom. Por exemplo o livro sobre o INEM do Augusto Brázio, o vencedor deste ano do Visão, foi pago pelo INEM e permitiu ao fotógrafo seguir com tempo a actividade da instituição. Um bom exemplo a seguir. Só que, se fosse levado a sério o código deontológico dos jornalistas, esta prática seria pura e simplesmente condenada. Refém da mentalidade dos anos setenta, o sindicato não aceita que um jornalista possa trabalhar fora do circuito de imprensa. É um diparate mas é assim.

(também no Expresso online em Flagrante deleite)

2 comentários:

  1. "Os leitores aceitam ver imagens dolorosas numa exposição mas não lhes agrada muito vê-las ao sábado ao pequeno-almoço depois de terem pago 3 euros ou 4 por um jornal. Esta é a verdade. É como passar documentários sociais no prime-time. Foge tudo para a novela. E podemos não estar de acordo mas é esta a realidade cultural, onde há uma classe média, e é ela que compra os jornais."

    às realidades culturais, somos todos nós que as fazemos. E estamos (estão) a criar uma realidade cultural paupérrima. Há ainda um público que foge da novela e que é esquecido em Portugal, que simplesmente não existe para as revistas e jornais nacionais. Cada vez menos texto, raramente fotografias de relevo, dois jornais tidos como mais relevantes, eventualmente uma revista, no depauperado panorama nacional.

    Dê-me exemplos do que tem surgido ultimamente em Portugal tentando contrariar esta massificação pseudo cultural do 'tadinho?

    Os leitores da Grande Reportagem (a mensal) ficaram orfãos e ninguém se preocupa em dar-lhes um portinho de abrigo em região nacional.
    Mas eles existem, andam aí, compram jornais e revistas (ou já não) pelo hábito e para podermos dizer que o panorama da imprensa nacional está decadente.

    Um exemplo do meu pequeno universo: ontem, em seis pessoas, 4 liam socialite enquanto 2 dividiram o expresso, que depressa abandonaram, trocado por livros.

    Não há leitores para a boa imprensa ou não haverá imprensa para leitores mais exigentes?

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  2. As já estamos fartos de palhaçadas!
    São muitos anos de lavagem cerebral!
    As fotos já não entram dentro das mentes das pessoas! O publico sabe que por detras duma foto publicada existe uma politica que quer comprar a "opinão publica".
    Os portugueses são dos povos que mais foram enganados pelos politicos e por isso preferem telenovelas e noticias de casamentos e divorcios.Essas enganam pouco! Mais aborto menos aborto , vai tudo dar ao mesmo!

    Povos mais enganados pela imprensa que os portugueses , só os Africanos, para os quais vende-se sempre muita esperança!

    Nós já estamos nesse nivel!

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